segunda-feira, 16 de maio de 2016

Registro da apresentação do Grupo Cafuringa no Bairro de Santo Amaro-Recife/PE

"Cafuringa não morreu ele encantou-se"


 Logo na chegada a rua, que inclusive foi à rua onde residiu o artista popular cafuringa, já me sentir acolhida e também animada com o som vivo da população que se remexia para a formação da roda, sem dúvida, plateia animadíssima e variada, com crianças, jovens, idosos, homens, mulheres, e principalmente, uma convidada de cabelos brancos, serenamente sentada em um banco de madeira, era a mãe do artista, a mãe da inspiração para a cena, a mãe de cafuringa. Como seria á vida desse artista? Como acontecia seu dia- dia de artista popular, ganhando a vida nas ruas de Pernambuco? Vendendo sua formulas, pomadas, brincando com seus bonecos, fazendo arte para trabalhadores como ele, que cotidianamente vão e vem nas suas batalhas diárias para comer, vestir, morar, viver.
O Espetáculo “Cafuringa” versa sobre batalha também, artistas-trabalhadores que tem seus salários enlaçados com o chapéu aberto na roda de rua, é um trabalho-brincadeira que alimenta muitas bocas. E assim começa o trabalho-brincadeira do artista cafuringa, levado a cena pelo ator Luís Chaves, os outros atores do grupo dão vida a alguns bonecos brincantes do artista. No espetáculo, cafuringa personaliza um sujeito deslizando entre o sério e o irônico, já seus bonecos são mais cômicos, grotescos, arremedeiros, burlescos. Cafuringa aparece como o operário da arte, militante das ruas, que ensina como resistir e existir; e através de seus bonecos grita sua condição, todavia também sussurra e encanta com sua ludicidade, desperta nas brincadeiras, músicas, sons e cores de sua arte. Assim, o espetáculo joga com antagonismos: dor e alegria, luta e paz, vida e morte. Também a palavra é um elemento forte, a palavra que é poder e lei e que proíbe o artista cafuringa de mostrar sua arte nas praças, também sua palavra, voz de ventríloquo, ambulante, operário-artista, curandeiro popular e negro, que incita, luta, questiona, provoca. Assim como as palavras ditas pelos palhaçeiros que o acompanham, que trazem o repertório cômico, a fala aberta e corpóreo-gestual do grotesco, citada por Bakhtin com o “vocabulário da praça pública”, que se expressam em gestos, sensações, sonoridades, cheiro e emoções. Essa proximidade, essa transgressão da palavra (escrita, sentida e corporal) o despudor, a sensualidade e atração, que emanavam de seus bonecos, piadas, produtos e criação, geraram a violência, perseguição e controle para com sua arte.



A proposta do espetáculo, pelo menos nessa apresentação foi o uso do semicírculo, com caixas baús espalhas no espaço cênico de onde saem materiais, bonecos, elementos; e também convertidas em praticáveis, para elevação do plano de cena. A música é dramaturgia, nos vai conduzindo para desvelar o universo de brincadeiras e luta do artista cafuringa. E nesse caminho, vamos rememorando seus números, habilidades, coisas de cafuringa. Imaginava eu, como ele seria ainda vivo? Seu porte, tom de voz, jeito? O espetáculo brinca também com nossa saudade, trama a trama fui me revoltando e querendo lutar com ele nosso embate pala arte, pela liberdade em mani-festar nosso trabalho-brinquedo.
 Ao final a saga do artista popular se finda no bairro do santo amaro-recife-pernambuco, e seus bonecos que muito riram por vida choram sua morte, mas Cafuringa não morreu, ele encantou-se, navega guerreiro em cima de sua cobra -serpente, alimentando de luz e sonhos, nossa arte pública.



Raquel Franco

https://www.facebook.com/grupocafuringa/?ref=br_rs

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